A
expressão “Noite Escura da Alma”, originalmente cunhada por São João da Cruz,
descreve um período de intensa crise espiritual e existencial, no qual a pessoa
experimenta a ausência de sentido, a perda de referências e a sensação de
abandono divino. Na psicologia analítica de Carl Gustav Jung, essa vivência
pode ser compreendida como uma etapa fundamental do processo de individuação —
isto é, o caminho em direção à totalidade psíquica e à realização do Si-mesmo.
Para
Jung, o sofrimento profundo, as perdas e as crises que compõem a “noite escura”
não são apenas obstáculos, mas oportunidades de transformação. Em sua obra, ele
enfatiza que a psique possui uma dinâmica autônoma que, através de símbolos e
imagens, conduz o indivíduo a integrar conteúdos inconscientes reprimidos.
Assim, momentos de escuridão podem ser vistos como chamados internos para o
confronto com a sombra — os aspectos negados ou não reconhecidos da
personalidade.
A “noite escura” é, nesse sentido, uma travessia pelo inconsciente, em que antigas estruturas do ego entram em colapso, abrindo espaço para uma nova relação com o Si-mesmo. Jung afirma que esse confronto pode ser doloroso, pois exige a morte de ilusões e a renúncia a identificações rígidas, mas é também o ponto de virada para uma vida mais autêntica e integrada (JUNG, 2011).
Em
diálogo com a tradição mística, Jung via na experiência da escuridão interior
não apenas um sofrimento patológico, mas também um processo iniciático.
Trata-se de um mergulho necessário, em que a psique busca restaurar sua ordem
simbólica e reorientar o indivíduo em direção a um propósito mais profundo.
Nessa perspectiva, a “noite escura da alma” pode ser entendida como uma
expressão arquetípica do caminho humano rumo à transcendência.
Evandro Rodrigo Tropéia
Psicoterapeuta
CRP: 06/143949
Referências
bibliográficas:
JUNG,
C. G. Aion: Estudos sobre o Simbolismo do Si-mesmo. 11. ed. Petrópolis: Vozes,
2011.
JUNG,
C. G. Memórias, Sonhos, Reflexões. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2016.
JUNG,
C. G. Psicologia e Religião. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 2012.
STEIN,
Murray. Jung: O Mapa da Alma. São Paulo: Cultrix, 2006.
SANFORD,
John A. O Inconsciente como Graça. São Paulo: Paulus, 1991.

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