Um dos
grandes fatores que contribuem para a perda parcial ou total da energia
psíquica a qual denominamos libido é o sequestro do próprio eu. Pessoas deixam
de ser para si mesmas para serem parte total ou propriedade do outro, do objeto
amado. Elas deixam de ser “alguém” para serem apenas “algo”.
Outro
grande tema psicanalítico que contribuirá para o desenvolvimento desse trabalho
de maneira expressiva é o conceito de Relação Narcisícas ou Narcisistas,
proposto por Sigmund Freud no ano de 1914, em sua obra “Sobre o Narcisismo: Uma
Introdução”.
Freud (1914) havia declarado que o narcisismo era uma fase
intermediária necessária entre o auto-erotismo e o amor objetal. Ele descreve
em sua linha de pensamento um breve sumário dos caminhos que levam à escolha de
um objeto.
Uma pessoa pode amar:
1) Em conformidade com o
tipo narcisista:
a) O que ela própria é
(ela mesma);
b) O que ela própria foi;
c) O que ela gostaria de
ser;
d) Alguém que foi uma vez
parte dela mesma.
2) Em conformidade com o
tipo analítico (de ligação):
a) A mulher que alimenta;
b) O homem que a protege.
O desenvolvimento do ego consiste num afastamento do
narcisismo primário e dá margem a uma vigorosa tentativa de recuperação desse
estado. Esse afastamento é ocasionado pelo deslocamento da libido em direção a
um ideal do ego imposto de fora, sendo a satisfação provocada pela realização desse
ideal. (FREUD, 1914)
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Sigmund Freud |
Sigmund Freud relata
que: O ideal do ego impõe severas condições à satisfação da libido por meio de
objetos, pois ele faz com que alguns deles sejam rejeitados por seu censor como
sendo incompatíveis onde não se formou tal ideal, a tendência sexual em questão
aparece inalterada na personalidade sob a forma de uma perversão. Tornar a ser
seu próprio ideal, como na infância, no que diz respeito às tendências sexuais
não menos do que às outras – isso é o que as pessoas se esforçam por atingir
como sendo sua felicidade.
O Ego idealizado desvenda um importante panorama para a
compreensão da psicologia de grupo. Além do seu aspecto individual, esse ideal
tem seu aspecto social; constitui também o ideal comum de uma família, uma classe ou uma nação.
Ao mesmo tempo, o ego emite as catexias objetais
libidinais. Torna-se empobrecido em benefício dessas catexias, do mesmo modo
que o faz em benefício do ideal do ego, e se enriquece mais uma vez a partir de
suas satisfações no tocante ao objeto, do mesmo modo que o faz, realizando seu
ideal. (FREUD, 1914)
A
psicanálise nos ensina que para um vínculo ser estabelecido com o outro de
maneira saudável, dependerá da maneira como se é capaz de relacionar-se consigo
mesmo.
A idéia
proposta no trabalho presente sobre o estabelecimento de vínculos é o que
chamaremos aqui de “Alianças e Alienações”.
A
Aliança encontra-se na dimensão do acordo firmado entre duas ou mais partes.
Este vínculo tem como objetivo primordial e realização de fins que coincidem
para o bem comum.
A
priori, a aliança acontece pela identificação que ocorre de ambas as partes
envolvidas na construção do vínculo. Existe algo no outro que parece coincidir
com algo que falta no sujeito. Esse fato ocorre de forma inconsciente, por
conta da dificuldade que temos em enxergar com clareza aquilo que nos falta.
O processo de construção e
desenvolvimento de uma verdadeira aliança de vê ocorrer de forma lenta e regada
por muita dedicação.
Por outro lado, a partir de uma
fragilidade emocional, o sujeito se percebe submergido numa aliança perversa, a
qual denominamos “Alienação”.
Na
Alienação, o sujeito se vê impedido de ser ele mesmo pelo fato de nem ao menos
suspeitar de quem ele realmente é.
O
indivíduo torna-se incapaz de estabelecer uma confiança a si mesmo, e assim
projeta toda sua energia psíquica no outro, o objeto amado. O ego desenvolve
uma extrema carência de si mesmo e se coloca em posição de negação.
A
verdadeira aliança é nutrida pela capacidade de se conhecer as partes
envolvidas na construção do vínculo.
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Aliança saudável e verdadeira |
A
Aliança será saudável quando for mantida pelo carinho, dedicação e compreensão
de ambas as pessoas, desenvolvendo então, um vínculo afetivo emocional baseado
em uma relação de confiança.
A vida
humana é uma travessia constante. Vivemos em êxodos contínuos, em processos de
deslocamento quase que intermináveis que são conscientes e inconscientes.
Enquanto estivermos em vida seremos convidados a estar em movimento o tempo
todo e isso nos proporciona a superação de estágios, condições e até mesmo no
campo das atitudes.
No
entanto, a questão que pretendo propor aqui é que essa travessia não é banhada
por imenso mar de rosas de ouro e cristais brilhantes, mas quero desenvolver
juntamente com os caros leitores a expansão do pensamento de que esse caminho a
ser percorrido é um processo doloroso e extremamente complexo.
Nascemos
como seres individuais, mas a condição de ser pessoa na sua totalidade é um
lugar a ser alcançado. Precisamos, através de nosso processo de desenvolvimento
psíquico pessoal, chegar aos dois pilares fundamentais que proponho no presente
trabalho:
Ser
pessoa no conceito da totalidade no contexto de Mundo Interno e Mundo Externo
consiste em “dispor de si” e “dispor-se ao outro”.
O que
defino aqui por Sequestro do eu é um acontecimento que fere diretamente o
primeiro aspecto do processo que é a disposição para si mesmo.
Na vida
humana, estamos constantemente descobrindo a nossa totalidade. Para tal
afirmação vamos nos atentar aqui a uma comparação muito interessante que irá
contribuir consideravelmente para a expansão da nossa proposta de pensamento:
O
mosaico é composto por partes; essas partes se unem em um conjunto e compõem
uma única peça. São inúmeros e pequenos significados que juntos formam a
totalidade do mosaico.
A
pequena peça é fundamental para a construção do todo, e por isso não pode ser
separada ou simplesmente descartada. Nós seres humanos, somos desenvolvidos a
partir dessa mesma ideia.
Quando
o sujeito é sequestrado do seu próprio eu, o primeiro rompimento que se dá é
com a materialidade de seus significados. Tudo perde o sentido, nada tem valor
com a ausência de seu objeto amado.
(Evandro Rodrigo)